segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Humilhados, Ofendidos, Conformados e Submissos

Recordando o grande Jornalista Homero Serpa

Crónica do Jogo F.C. Porto 3-0 Belenenses 5ª jornada da época 2004/05
jogado na data de 03/10/2004 às 19:15 no estádio do Dragão, com transmissão em directo na TVI, estiveram no estádio 39418 espectadores,
Recorde-se que o jogador mais influênte no meio campo do Belenenses, Juninho Petrolina fora expulso aos 21 minutos de jogo com duplo amarelo, ou seja foi expulso em apenas 9 minutos, ao ter visto o 1º amarelo aos 12 minutos de jogo e o 2º amarelo aos 21 minutos de jogo. Até então o jogo estava a ser bastante dificil para o Porto, embora o resultado seja volumoso
os golo foram marcados já depois da expulsão aos, 34m, 71m, e 90m de jogo.
Fica então a crónica do grande e saudoso Homero Serpa.


Durante toda a semana que ontem findou, os comentaristas do futebol surraram o árbitro, sr. Elmano, que não é sadino como o glorioso Bocage nem obteve o sobrenome na Nova Arcádia, nem, que eu saiba, escreve poesia, antes reside na Madeira e veste o equipamento de um prosaico juiz de campo, com todos os poderes para, se quiser, alterar o rumo dos jogos e, obviamente, os resultados. O dito senhor foi, realmente, o bombo onde os indignados prosadores acertaram em cheio com as suas críticas mordazes e zombeteiras porque, muitas vezes, a ironia marca muito mais os comportamentos dos homens do que as palavras ditas ou escritas no tom austero.

Até me pareceu que as censuras dos cronistas não tiveram eco suficientemente forte na reacção do próprio Belenenses a avaliar pela frieza, provavelmente política, com a qual o clube deludido pela arbitragem do supracitado árbitro, encerrou a questão, no estilo nada a fazer, fomos enganados mas isso é natural no futebol. Quem manda no clube de Belém saberá por que razão colocou uma pedra sobre o assunto, mas, para mim, o caso tem extrema gravidade porque a arbitragem do jogo FC Porto-Belenenses não teve a clareza que os adeptos fiéis à verdade desportiva devem exigir dos protagonistas dos desafios, desde os jogadores aos dirigentes, passando, obviamente, pelos senhores árbitros, que parecem ser um género de imperadores romanos com a prerrogativa de inclinar o polegar para baixo ou erguê-lo, ditando deste modo a morte ou a vida. A desculpa para todos os disparates das arbitragens, mesmo os mais absurdos ou inexplicáveis, é sempre a mesma, o pobre árbitro tem de julgar em cima do acontecimento. Não deixa de ser uma verdade, todavia intolerável se persistente e de uma cor apenas, mas não devemos observar as actuações dos árbitros por aquela filosofia ou caímos na absolvição sistemática dos seus erros.

O jogo do Belenenses no Estádio do Dragão, o fumívomo bicharoco que, pelos vistos, assusta muita gente, tinha a caracterizá-lo a desvantagem do FC Porto em relação ao Benfica, que ia jogar em Guimarães e até podia perder pontos como esteve quase a acontecer. Ora, o exemplo da resistência do Estoril, duas jornadas antes, aquele empate arrancado nos últimos minutos, o susto que representou lance estorilista nos derradeiros segundos anulado por pretenso fora-de-jogo, criou ao Belenenses o ambiente da derrota anunciada, a menos que por influência de um dos deuses do firmamento politeísta do jogo da bola se alterasse o rumo do inevitável sucesso portista. O árbitro Elmano tinha, à partida, missão complicada que um resultado negativo, a prolongar-se, agudizaria. O árbitro terá sentido esse perigo, presumivelmente foi, até, mais uma pressão que sofreu, mas quem entra num campo a fim de fazer respeitar as leis do jogo não pode hesitar na sua condição de juiz imparcial, não pode deixar-se prosternar pela inamissibilidade que é o sentimento, tão rude como realista, dos senhores do futebol. O trecho mais visível da má arbitragem foi a expulsão do jogador Petrolina. Ele mesmo deu o mote, considerando a sua expulsão como premeditada. Exagero do jogador ferido pela injustiça do árbitro? Será sempre uma acusação impossível de provar mesmo tendo em consideração que a insensatez do árbitro reduziu uma equipa a dez unidades, amputando-lhe exactamente uma peça fundamental do meio-campo, ainda comparte e meia para jogar.

Premeditada ou não, a verdade é que os portistas acabaram por encontrar o caminho para a baliza de Marco Aurélio, no domínio da subjectividade está a possibilidade do Belenenses chegar ao fim do desafio como vencedor ou sem sofrer golos, intrigante ou talvez não foi a reacção do treinador Carvalhal, a roçar pela angelitude, uma reacção que transpira o receio de falar, de dizer aquilo que sentia porque poderia incorrer na alçada do sistema. Aliás, não deixa de ser assustador que, até, no futebol um indivíduo sofra a trágica e suja lei da rolha, mas, enfim, neste aspecto, em Portugal como noutros países a censura está a ganhar o perfil do monstro que nos quer subjugar. Mas não quero consumir este tema, sem lhe acrescentar o principal. Um clube de futebol é, hoje, em muitos casos, uma empresa, que obviamente visa a saúde financeira com a venda do produto que oferece ao público e é apresentado pela equipa representativa nos campeonatos. Terá uma planificação, projectos, objectivos, não pode, por isso, ser torpedeada pela intervenção de indivíduos incompetentes ou coisa ainda pior, não pode estar à mercê dos interesses dos polvos que estendem os seus tentáculos nas direcções do lucro, exaurindo as pretensões dos menos apetrechados para uma luta que, às vezes, nos parece dirigida por padrinhos. O absurdo desta situação é que quando uma equipa é desviada das suas intenções de bem comercializar o seu produto sofre prejuízos morais e materiais. Já é difícil percorrer um campeonato inteiro em fervorosa competição quanto mais lutar contra o estigma da discriminação. E os jogadores?

Se há homens e instituições que se batem pelos trabalhadores e não desistem de os defender neste mundo de injustiças e prepotências, será inadmissível que, na indústria do futebol, espalhada por todo o país, embora instalada em patamares diferentes no estilo de socalcos de ricos, remediados e pobres, se cultive o favoritismo, agredindo gravemente os direitos dos seus trabalhadores? Os árbitros têm de pensar seriamente que as suas erradas decisões agridem gravemente a economia das empresas futebolísticas e dos seus servidores, sendo mesmo susceptíveis de ser discutidas nos tribunais. E ainda por cima não vemos os prevaricadores criticados nem punidos pelo organismo de classe, que se tem de preservar-lhes a imagem quando eles merecem, não pode absolvê-los dos atropelos a que assistimos frequentemente, dando-nos a impressão de que, em determinadas circunstâncias, a objurgatória fica no congeladora bem de inconfessáveis interesses. Se não houver equidade, nem respeito, nem justiça, então vale mais nomear o campeão nacional pela forma administrativa, deixando os outros clubes na situação dostoievsquiana de humilhados e ofendidos. E conformados acrescento eu.


Fonte:
Homero Serpa "Crónicas & Crítica"

7 comentários:

BT26 disse...

Posso sugerir uma coisa, em alguns dos post que fazes aparecem datas e resultados, mas noutros, como é o caso deste, não, quando assim for sugiro que faças uma frase (basta isso) de introdução, neste caso bastava dizer que era a crónica de Homero Serpa, relativa ao jogo corruptos-belém no dia tal (ou campeonato tal) que terminou x-y.

Em relação a crónica, maravilhosa. E poderia ser escrita esta época umas 4 ou 5 vezes. A verdade é que boavista (por outras razões), belém e Estrela Amadora, são alguns exemplos destes campeonatos de merda e, que neste momento estão em risco de acabar (salvo erro o Estrela já não tem equipa sénior).

Benfica sempre.

Paulo Da Silva disse...

Enorme e amigo BT26, seguindo o teu excelente conselho fiz uma pequena introdução ao texto, com as datas precisas em relação a este FC POrto Belenenses.
Um enorme abraço e muito obrigado.

joão 2 disse...

qualquer comparação entre este enorme Serpa e o seu,creio,rebento,é de uma "angelitude" para uma coisa abstracta.
saudade que tenho de ler cronicas destas sobre um jogo de futebol;verdades.

Paulo Da Silva disse...

Caro João, tb eu sinto saudades de crónicas como as do gigante jornalista Homero Serpa.
Não sei a quem te referiste como meu Serpa, espero que não seja o actual o Victor... porque esse é do pior que há com tiques da velha senhora.

Para mim homens como o Homero Serpa, Carlos Pinhão e Fernando Farinha e Rui Cartaxana foram os últimos Grandes Jornalistas da nossa praça, homens que não tinham medo do sistema implantado e que tinham orgulho, sabiam o que escreviam e não tinham qualquer tipo de problema em escrever a verdade e somente a verdade, ou seja não tinham problemas em escrever as verdades sobre o sistema.

Enorme abraço e obrigado pela visita e comentário amigo João.

BT26 disse...

Muito obrigado por seguires o meu concelho/pedido.

Em relação ao joão 2, penso que ele se está a referir a esse serpa (vitor) dizendo ("seu") ser filho do Serpa (Homero). Não sei se é verdade ou não, mas se for, mas que raio de fruta, foi cair muito longe da árvore.

Já agora, Carlos Pinhão é pai da Leonor Pinhão? Esta já não é fruta, é mesmo uma flor que desceu da árvore e agora está a crescer como uma bela árvore, uma das poucas árvores do nosso jornalismo.

Benfica sempre.

joão 2 disse...

31 dez. 2007 ... Faleceu esta madrugada Homero Serpa, um dos nomes históricos de «A Bola», pai do actual director, Vítor Serpa.
Carlos Pinhão era o pai de Leonor Pinhão.
Carlos foi o jornalista que levou uma tareia depois de um jogo do porto em Aveiro

BT26 disse...

Obrigado pela confirmação, e pelo aviso da resposta no outro post :)

Benfica sempre.